quarta-feira, 22 de abril de 2009

Dar a palavra a outro

Quando não temos palavras interessantes para publicar, nada melhor como utilizar as palavras de outrem. A pessoa que escreveu as palavras, fala sobre um assunto, o qual subscrevo na totalidade. outros assuntos em que estou totalmente em desacordo, mas neste comungo das mesmas ideias. Vejam o post de José Saramago, que podem encontrar, juntamente com muitos outros em http://pt.wordpress.com/tag/o-caderno-de-saramago.


"Vaticanadas

By José Saramago (8 Fevereiro de 2009)


Ou vaticanices. Não suporto ver os senhores cardeais e os senhores bispos trajados com um luxo que escandalizaria o pobre Jesus de Nazaré, mal tapado com a sua túnica de péssimo pano, por muito inconsútil que tivesse sido e certamente não era, sem recordar o delirante desfile de moda eclesiástica que Fellini, genialmente, meteu em Oito e Meio para seu e nosso gozo. Estes senhores supõem-se investidos de um poder que só a nossa paciência tem feito durar. Dizem-se representantes de Deus na terra (nunca o viram e não têm a menor prova da sua existência) e passeiam-se pelo mundo suando hipocrisia por todos os poros. Talvez não mintam sempre, mas cada palavra que dizem ou escrevem tem por trás outra palavra que a nega ou limita, que a disfarça ou perverte. A tudo isto muitos de nós nos havíamos mais ou menos habituado antes de passarmos à indiferença, quando não ao desprezo. Diz-se que a assistência aos actos religiosos vem diminuindo rapidamente, mas eu permito-me sugerir que também serão em menor número até aquelas pessoas que, embora não sendo crentes, entravam numa igreja para disfrutar da beleza arquitectónica, das pinturas e esculturas, enfim de um cenário que a falsidade da doutrina que o sustenta afinal não merece.
Os senhores cardeais e os senhores bispos, incluindo obviamente o papa que os governa, não andam nada tranquilos. Apesar de viverem como parasitas da sociedade civil, as contas não lhes saem. Perante o lento mas implacável afundamento desse Titanic que foi a igreja católica, o papa e os seus acólitos, saudosos do tempo em que imperavam, em criminosa cumplicidade, o trono e o altar, recorrem agora a todos os meios, incluindo o da chantagem moral, para imiscuir-se na governação dos países, em particular aqueles que, por razões históricas e sociais ainda não ousaram cortar as sujeições que persistem em atá-los à instituição vaticana. Entristece-me esse temor (religioso?) que parece paralisar o governo espanhol sempre que tem de enfrentar-se não só a enviados papais, mas também aos seus “papas” domésticos. E digo ainda mais: como pessoa, como intelectual, como cidadão, ofende-me a displicência com que o papa e a sua gente tratam o governo de Rodriguez Zapatero, esse que o povo espanhol elegeu com inteira consciência. Pelos vistos, parece que alguém terá de atirar um sapato a um desses cardeais."

Um grande abraço a todos

1 comentário:

Jeremias disse...

Pois, bem visto.
Penso que Saramago se refere ao facto do Vaticano tornar santo o nosso histórico "Condestável" (que era um feroz anti-espanhol e matou muitos espanhóis) como forma de "castigar" a Espanha. Não estou dentro do assunto mas esta era a opinião de um colunista no jornal de leiria desta semana.

Acho que este assunto, o das hierarquias da igreja, tem muito que se lhe diga e é um tema que deve ser mais abordado aqui na tasca.