quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Ganância e futuro

Em tempos, numa acção de formação, aprendi umas noções básicas de contabilidade. Não sendo a minha área de especialidade fiquei bastante espantado com algumas das coisas que aprendi.
A mais interessante era aquela que nos pedia para fazermos "balanços": desenhávamos numa folha um enorme risco (no meio da folha) e colocavamos do lado esquerdo os "activos" da empresa e do lado direito os "passivos" da empresa. A saúde financeira da empresa media-se somando todos os activos e os passivos da empresa e fazendo-se por fim o balanço. Se fosse positivo a empresa estava com lucro, se negativa, prejuizo. Parecia simples.

O que me espantou nesta ciência foi que no lado dos activos se colocavam todas as dívidas que os clientes deviam à empresa, ainda que estes não as tivessem ainda pago ou, sabe-se lá, tivessem intenções de pagar. Para a empresa uma dívida de um cliente era um "activo" e faziam-se as decisões estratégicas da empresa a contar com dinheiros que, para todos os efeitos, ainda não existia.

A recente crise financeira levou-me a recordar este episódio e a verificar o perigo que é ter um sistema financeiro que assenta não em dinheiro mas em "títulos de dívida" como na contabilidade. Aparentemente (e posso estar enganado pois esta não é a minha área) os bancos trocam entre si e as empresas títulos de dívida como se de dinheiro vivo se tratasse. Papeis que não têm valor por si mas que dependem de esforços futuros de alguém que, por razões várias, poderá não conseguir transformá-los em dinheiro vivo.

O crédito que um banco nos dá é, se virmos bem, um "título de dívida" onde eu alugo o meu esforço de trabalho futuro para o vir pagar. Esforço esse que, sendo o futuro tão inconstante, posso não conseguir assegurar.

Qual é o valor do futuro? Deveria uma economia depender tanto do futuro?

Não tenho respostas mas penso que trasaccionar coisas que ainda não existem é uma coisa arriscada. E, na conjunctura actual, foi um risco que os bancos fizeram e onde se deram muito mal.

2 comentários:

Anónimo disse...

É engraçada essa ideia do Balanço. Visto desse ponto parece realmente muito simples... um débito e um crédito... na realidade, as coisas não são bem assim...

Parabéns pela perspectiva do tema...

Jaquim Pimpão disse...

O mais triste, é eu como estudante ser todos os semestres, injectado com disciplinas de gestão e economia, que nos ensinam a ser racionalistas e pragmáticos na análise e tomada de decisões, numa empresa...
Neste momento questiono-me sobre o que vou "apanhar" na realidade...
Porque o sistema financeiro está bem pensado, na teoria em que existem empresas de auditoria(?), certificações e empresas reguladoras que tem missões diferentes a cumprir...mas pelos vistos...nada funciona(ou)...porque outros "valores" das pessoas que estão à frente dessas empresas (auditores e reguladores) se levantam...
É claro que algum dia a piramede tinha que ruir...

Jaquim Pimpão